sexta-feira, 22 de março de 2013

Questão de Ser (Crítica: O Lado Bom da Vida / 2012)

"As maiores loucuras são as mais sensatas alegrias, pois tudo que fizermos hoje ficará na memória daqueles que um dia sonharão em ser como nós: Loucos, porém, FELIZES!"
Kurt Cobain



Não é todo dia que conseguimos encontrar um projeto com tanta gente bacana envolvida. Um diretor promissor, que caminha a passos largos para um futuro Oscar, um galã divertidíssimo, uma menina em estado de graça e dois veteranos de peso se juntam na maravilha que O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, EUA. 2012) tinha tudo para ser. De fato, o filme de David O. Russel tem um pé atolado na mesmice, mas o quarteto de atores é tão genuinamente bom, que a outra perna da obra se cobre de joias brilhantes. Contudo, se o resultado final basicamente se traduz como um filme de atores, algumas das outras indicações ao Oscar parecem exageradas, enfiadas goela abaixo.

Indicado a incríveis 8 categorias do Oscar, O Lado Bom da Vida foi conquistando tímidos corações ao redor da Terra, dialogando tête-à-tête com cada um dos seus espectadores, que fascinados pela beleza e força dos atores, juntaram-se a um imenso conglomerado de fervorosos fãs do filme e da atriz Jennifer Lawrence, uma das protagonistas da obra.



O. Russel é um diretor realmente muito profundo, coerente com seus personagens e roteiro, sem contar que produz monstruosas personificações com um simples tatibitate no pé do ouvido de seus atores. Em O Vencedor (2010), a maior prova de seu talento, David O. Russel levou uma legião de mentes duvidosas ao chão dirigindo Christian Bale, Amy Adams e Melissa Leo. Aqui não é diferente, O. Russel tira o sangue do quarteto nessa edificante história sobre amor, loucura e confiança. Embora pareça que a carreira do diretor transite em círculos ( e o próprio texto siga essa tendência), seu maior legado tem sido a direção de atores, absolutamente inquestionável.

A trama, que também tem roteiro escrito pelo diretor, segue os passos de Pat Solitano (Bradley Cooper, em louvável caracterização), professor bipolar que, após flagrar a esposa com o amante e quase matá-lo, é internado numa clínica de recuperação. O personagem de Cooper revela-se um sujeito realmente adoentado na pela própria condição mental, que ressurge em crises homéricas na hora dos questionamentos de mérito tão superficial ou simplesmente a partir de uma lembrança profundamente perturbadora. O problema de Pat é não reparar que o que lhe causa malefícios é justamente o que ele persegue.

Após voltar para casa dos pais, interpretados por Jacki Weaver e Robert DeNiro (como há muito tempo não víamos, enchendo a cena), Pat conhece a depressiva Tiffany (Lawrence), que logo de cara se joga nas costas do sujeito. Tiffany perdeu o marido ainda muito jovem, mora no fundo da casa dos pais e se relaciona com todo tipo de homem, na esperança de se preencher finalmente. Quando as duas figuras trocam o primeiro olhar percebemos diferentes reações. Enquanto Pat vê apenas mais uma garota problemática, que pode dificultar sua reaproximação com a esposa, Tiffany se lança numa jornada de interesse próprio para redescobrir seu mundo. Isso, de fato, parece cair por terra no primeiro segundo, principalmente depois que Pat vê na garota uma potencial mediadora entre ele e a ex-esposa, e Tiffany o vê como seu parceiro num concurso de dança.



Se por um lado o diretor desvenda seus personagens com o auxílio de um texto resplandecente, reproduzindo fantásticos diálogos entre seus personagens; do outro, O. Russel começa a levar todo seu trabalho para um caminho de fácil percepção, onde surpresas são esquecidas e o caminho do "já vi isso antes" vai se tornando cada vez mais certo. Não há o que dizer da evolução das personas do texto, Pat e Tiffany são apaixonantes, mesmo na simpática insanidade que exala dos poros de Lawrence e Cooper, ou, até mesmo, quando vemos a relação de interesse se transformar num pulmão cheio de ar, vislumbrando o fim de anos enclausurados em suas respectivas mentes doentias. Encontrar a si mesmo e concretizar seu eu no mundo é a máxima de O Lado Bom da Vida, que vai juntando dança, futebol americano, pais com transtornos obsessivos, amigos com olhares de desconfiança e muita gente maluca num produto só. Recuperar a confiança em si mesmo e redescobrir esse lado bom da vida, mesmo que o resto do mundo desabe, será o desafio aceito por Pat e Tiffany.



Não é de hoje que eu digo que Jennifer Lawrence já é a nossa nova Meryl Streep, principalmente pela conciliação de grandes projetos envolvendo muito dinheiro com a suprema habilidade de estar extremamente envolvente em filmes menos visados. Depois do assombro em Inverno da Alma (2010), Lawrence conseguiu sua segunda indicação ao Oscar com a prolixa Tiffany, dessa vez saindo vitoriosa do Kodak Theatre.

PS: Se Emmanuelle Riva era, de fato, a grande atuação do ano, quem me explica esse Oscar de Melhor Atriz para Jennifer Lawrence? Seria Harvey Weinsten, o poderoso produtor por trás das grandes premiações? Ou seria apenas uma marmelada sem sentido? Talvez, um acesso de loucura ou simplesmente uma injustiça? Não sei, mas mesmo que tenha sido um prêmio infeliz, O Lado Bom da Vida explica minuciosamente qual é o encanto que Jennifer Lawrence emana. E que encanto.

Um comentário:

  1. Eu ainda acho este superior a O Vencedor, de qualquer forma, ambos de fato mostram o talento do diretor.

    Concordo inteiramente que a grande atuação do ano foi de Emmanuelle Riva, mas pelo menos o prêmio acabou indo para uma excelente atriz.

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