sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O Aroma que Habito (Crítica: Perfume: A História de um Assassino / 2006)

"E é nisto que se resume
o sofrimento:
cai a flor, — e deixa o perfume
no vento!".



Não sei nem por onde começar.

Após a insistência de uma pessoa (muito querida, por sinal), resolvi construir uma resenha crítica sobre Perfume – A História de um Assassino (The Story of a Murderer, Alemanha, França, Espanha. 2006). A minha resistência não tinha nada a ver com a qualidade da obra, que é inegável, muito menos com os possíveis defeitos que viesse a ter. Como disse Stanley Kubrick certa vez, Perfume era uma obra "infilmável", assim eu também consideraria um filme incriticável. Meu “medo” tem muito mais de impotência do que de entendimento. Não sei se dá pra entender, e é aqui que julgo o filme incriticável.

Perfume (é como eu vou me referir ao filme ao longo do texto) é baseado numa obra alemã de enorme sucesso, lançada na década de 1980 e traduzida para mais de 45 línguas. Patrick Suskind, autor do livro, relutou em vender os direitos de seu texto, graças a uma grande repulsa por adaptações cinematográficas. Em meio a isso, veio o interesse de grandes diretores, como Ridley Scott e Martin Scorsese. Porém, os direitos da obra só foram vendidos em 2001, quando caiu nas mãos de um diretor também alemão. Nesse momento, os fãs do best-seller comemoraram o fato da adaptação cinematográfica se manter em solo alemão.

A direção ficou por conta do talentosíssimo Tom Tykwer, responsável pelo grande sucesso Corra, Lola, Corra (1998). E nessa obra, podemos ver um lado totalmente distinto do que ele mostrou no seu grande feito. Aqui não veremos uma Franka Potente enlouquecida, correndo pelas vias da cidade, também não teremos explosão musical nem os cortes repentinos, pelo contrário, o filme se baseia numa estética muito mais subjetiva. O diretor teve que mudar muito do seu modo de dirigir, por isso se torna irreconhecível. A grande onda de sentimentos, quase que imperceptível aos olhos distraídos, é o grande trunfo dessa nova fase da carreira do diretor, se assim eu posso chamá-la.



A história se passa na França do século 18, envolta na sujeira e fétida fumaça dos tempos da Revolução Industrial, na correria de um Capitalismo embrionário, que já mandava e desmandava sem nenhum tipo de consideração social. Num mercado de peixe, embaixo da banca de sua progenitora, nasce Jean-Baptiste Grenouille (Ben Wishaw). Completamente guiado a morte, o bebê encontra no seu dom, o olfato apuradíssimo, a chance de viver, senão ele seria mais um dos filhos da feirante, que seriam jogados no rio Sena. Quando começa a chorar, Grenouille chama a atenção dos transeuntes e tem a sua oportunidade de viver. A reconstrução de Paris é simplesmente belíssima: O bebê jogado as traças, cheio de sangue, em meio à explosão humana da cidade transformou-se numa cena épica. Voltando a narrativa, a mãe é condenada por abandono e enforcada em praça pública. Restou a Jean-Baptiste o orfanato, onde será escravizado e virará fonte da renda da senhora que o abriga. Durante toda a sua infância no orfanato, Grenouille estará focado nos cheiros e perfumes que o rodeiam, desde a grama molhada até a água fria. Tudo é motivo de parar, apreciar cada odor e memorizar essência por essência. Ainda criança, Grenouille torna-se uma criança reclusa e solitária, numa linguagem mais facilitada: Estranha.

Mais tarde, o jovem é vendido a um curtume de confecção de couro, assim que dá as costas a senhora do orfanato, ela é assassinada por ladrões em um dos becos de Paris. Nesse curtume, Grenouille trabalhará 16 horas por dia e vai se manter fiel a seu chefe. Até que numa das entregas de couro no centro da cidade, Grenouille sente o aroma que mudará sua vida. Perseguindo o cheiro de uma jovem garota parisiense, Grenouille acaba por matá-la acidentalmente e descobre que esse mesmo cheiro se esvai junto com o último sopro de vida da pessoa. Obcecado por descobrir como preservar os perfumes que o surpreendem, Grenouille encontra um perfumista em decadência, o italiano Giuseppe Baldini (interpretado com afetação pelo mestre Dustin Hoffman), que após presenciar a genialidade do jovem com os odores e, claro, visando seu próprio lucro, comprará Grenouille de seu chefe, que também morre assim que o jovem vai embora. Procurei em diversos lugares algum texto que me esclarecesse as mortes de seus antigos “tutores”, mas não encontrei nada. Achei estranho que todos morressem assim que Grenouille fosse embora de suas vidas. Bom, sozinho, cheguei à conclusão, que Grenouille era uma espécie de estabilizador da ordem. Sua esquisitice mantinha todos em alerta e quando eram “dispensados” da convivência diária com Grenouille, acabavam por relaxar em sua vigilância (permitam-me a viagem metafórica).



É com Baldini que Grenouille vai aprender dar nome aos odores, apesar de que, o jovem parece ser muito mais talentoso que o ancião decadente. Mesmo assim, no que Grenouille busca, capturar e guardar cheiros, não vai poder ser auxiliado pelo mestre Baldini. É nesse instante que Baldini explica para o jovem Jean-Baptiste a lenda das 13 essências. Segundo a fábula, a combinação de 13 aromas proporcionará a quem confeccioná-la todo o amor humano e uma multidão a seus pés, conquistando, então, o mundo. Pena que Baldini não possa ensinar nada a ele sobre isso. Então, Grenouille parte para Grasse, a capital dos perfumes na época.

Nessa primeira metade, a história se mantém concentrada no personagem principal, na sua fixação por novos odores e, principalmente, nos indícios que o transformarão num assassino frio e calculista, embora, para mim, se pareça muito inocente. A trama corre lentamente, sem pressa nenhuma de mostrar mais do que deve antes da hora.

No caminho para Grasse, Grenouille descobre a grande sacada da obra: Ele próprio não tem cheiro. E esse é o grande motivo de possuir um olfato tão apuradíssimo. Grenouille chega a Grasse tomado pela obsessão de criar um cheiro para si, totalmente baseado na lenda dos 13 aromas. É nesse momento que o jovem passa a matar mulheres e experimentar novos modos de capturar o cheiro delas. Treze mulheres é a quantidade exata que Grenouille precisa para “dominar” o mundo. Em nenhum momento da obra, (eu, pelo menos) consegui enxergar o protagonista como um assassino, nem senti tanta repulsa. Isso acontece graças a pouca exploração que se tem no âmbito das cenas de assassinato. As cenas impressas no filme são muito mais ligadas ao domínio da arte que Grenouille tenta expressar, aos métodos de tentativa de capturar os perfumes femininos. Sua frieza é quase que sentida através de nossas narinas, mas seus olhos não conseguem esconder a inocência de um menino.



Quando entra em cena a jovem Laura (a lindíssima Rachel Hurd-Wood), o filme ganha uma nova face, algo mais perto de um thriller psicológico. Essa jovem vai se tornar a maior obsessão de Grenouille, pois é ela a dona do décimo terceiro aroma de seu perfume. O filme só se torna clichê quando entra em cena o pai da jovem, interpretado pelo eterno Severo Snape, Alan Rickman. Atrás de solucionar os casos de assassinato, o pai de Laura busca por meio de métodos do Direito e da Lei e Ordem, encontrar o rapaz e prendê-lo, proporcionando algumas cenas desnecessárias em que juntam tribunais, juízes e investigação a uma multidão de homens amedrontados pelo assassino em série.

Bom, não vou me aprofundar mais na história da obra, senão vou soltar grandes spoillers (mais do que eu soltei é impossível). Porém, quero chamar a atenção para a magnífica tomada final da obra. A população de Grasse ensandecida pelo prazer fugaz proporcionado pelo perfume de Grenouille. Na mesma hora pensei em Lars Von Trier. Atenha-se a cena, que consegue fazer uma crítica generalizada em poucos minutos. Detalhe: É uma orgia de proporções gigantescas.



É fato que Grenouille se tornou um homem sem emoções, impossibilitado de amar e ser amado, e julgou que “roubando” a dádiva que era o perfume de cada um, ele poderia, enfim, ser notado. Porém, como eu já disse, o perfume é fugaz, evapora com a rapidez de um estalar de dedos, nada fica, cada átomo de cada gota é um mero passageiro do tempo. Pela sua incapacidade de pensar em outra coisa que não seja cheirar (peço o perdão pela dubiedade), a personagem não se vê impedida por qualquer tipo de limitação, seja ela física ou moral.

Tecnicamente, o filme tem mais qualidades que defeitos. Com uma direção de arte fabulosa, uma fotografia esplêndida e um elenco competente (embora quem mais fale seja o narrador, trabalho exímio de John Hurt), o filme consegue proporcionar uma belíssima experiência de sentidos. Os defeitos que citei são mais particulares do que um dever no mundo do Cinema. A trilha sonora me pareceu exagerada, insistente. Embora seja muito boa, falta silêncio, momentos de reflexão tanto dos personagens quanto do espectador. A longa duração do filme (2h30m) também me pareceu desnecessária tornando o filme pesado e cansativo em diversos momentos. No geral, erros que não comprometem o resultado final da obra.



Eu consigo vislumbrar o principal motivo desse filme ter me conquistado: A capacidade de passar para o espectador a sensação atribuída ao mais complexo dos sentidos. Sentir cheiro que lembre a infância, concentrar câmera nos poros do nariz do protagonista, levar o espectador a uma viagem pela imaginação do personagem é o que torna esse filme “infilmável”. Apesar de tudo, conseguimos nos encantar pelo ambíguo amor que Jean-Baptiste sentia por esse vento enfeitado de aromas.

12 comentários:

  1. Tua crítica é rica, realmente soube dosar a sinopse deste belo filme com sua crítica bem pontual - gostei do teu modo particular em falar das sensações deste filme. Ao meu ver, é uma pequena obra-prima! Sinceramente, fiquei muito satisfeito com tudo, até a trilha sonora e não acho que ela seja prejudicial e que o filme precisasse de mais "silêncios". O diretor soube muito bem tornar o livro cinematográfico, sem perder a essência de tudo. Falarei do filme no meu blog daqui a uns dias, aguarde. Parabéns pelo texto!

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  2. Confesso que é um filme que preciso rever com mais calma.

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  3. entre tantas críticas deste filme, sua sinopse relata um sentido em que deve se ser bem atuado na qual a realidade deste filme por seu um criado assim se faz no que ao alto se releva um sentido endogsniscador assentado um dom!!aviso críticador.

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  4. jesus está voltando se prepare porque a chegada de jesus está perta e se vc quer ir para o céu corra e aceite jesus como seu salvador

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  5. Este filme é otmo e meche com os nossos nervos,
    A parte qe ele faz o perfume perfeito e meche com todos
    menos ele, é como si seila vc começe e nao matasse a fome. =P
    uma amiga tem o livro qro ainda ter a oportunidade de le-lo

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  6. Não precisa viajar na morte dos tutores dele. Se assistir o filme com atenção, verás que, logo após ele ir embora, a casa deles desmorona (como já ameaçava sempre com a ocorrência frequente de tremores ou coisa parecida.

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  7. Vi o filme ontem, pela primeira vez e lendo sua crítica (muito boa, por sinal) pensei que talvez as pessoas com quem ele mantinha certo vínculo durante a vida morriam quando ele partia porque, assim como os perfumes, a história de Jean Batiste dissipava-se. Seria uma metáfora para uma vida baseada somente no olfato. Talvez não tenha me expressado corretamente, mas espero que entenda o sentido.
    Grande abraço.

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    1. Concordo. Creio que foi a forma do escritor demonstrar que Jean Baptiste não formava vínculos. Não deixava e não levava nada por onde passava. A história dele se dissipava como um ¨per fumum".

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